quarta-feira, 30 de junho de 2010

num piscar de olhos

agora que meus olhos
não sabem mais
se o tempo
do sol
é tempo mesmo
ou se tudo não passa
de saborosa sensação
de lua cheia
em meu estômago
saciado luar

brilho a cada momento

por via das dúvidas
mais vale um voo
despretencioso suave
na janela de cada
segundo
para admirar
a paisagem do tempo
com amor e
sem precisão

tempo é
sempre cisão
nunca
preciso

desapego livre fluxo
e muitos frutos

segunda-feira, 28 de junho de 2010

curta metragem


depois da meia noite
escrever deixa de ser um ato
e passa a ser cena

sem ensaio

personagens desempenham
as dúvidas da caneta
as falhas da tinta azul
incertezas sutis de mãos viris

estirados na cama
amassam seus papéis
jogando-se contra a parede
para analisar
os próprios borrões

lençol ali faz motim em frenesi
e já suado de tanta fricção
se confude com os pêlos
do corpo que ora o habita

não há insônia
cada bocejo é um rasgo
que se abre para gracejos
de vácuo no tempo

e os pés pelas cobertas
encenando travessias
e forjando cheiros

travesseiros

piada travessa
pois na ilha de edição dos sonhos
toda a equipe de produção
está de brincadeira

travesseiro é nuvem de penas
desaguando sonhos penados desencarnados
da cabeça em riste repouso

transe d'uma noite só

transa bilateral imaginária
papel caneta gozo azul

quarta-feira, 23 de junho de 2010

sorria


se a loucura bate à porta
abra-a
receba-a com carinho
ofereça a ela aguardente boa
arda
se arder deixe-a voar
sua sala pode não suportar o voo
abra o telhado
deixe o céu entrar também
quanto mais, melhor
se o céu loucura vida
indiferenciarem-se
abra agora sua cabeça
sim,
é necessário um pouco de ar
talvez até uma ventania
para tirar o pó que se acumula
debaixo de tantos telhados

já de consciência limpa
abra o peito
com faca imaginária
ou afeto suave de doce lembrança
ali está a verdade
sem pó
nem telhado
com muito céu loucura vida
sol luz mato desejo tesão
e ali pode ser que o casamento dê certo
um pouco de abrigo
um sono confortável
muita luz e calor, pro frio se sentir a vontade
aquele amor na comida boa
e vez em sempre
um voo-livre:
risada

a vida é uma piada
aguardente boa

segunda-feira, 21 de junho de 2010

poeminha cigarro violento aceso


o cigarro e a memória
se casaram numa cerimônia fúnebre

a fumaça esquenta os grãos
dos poros na garganta à esquecer-se

tudo que é viável
torna-se brasa rasgada ao vento
numa violência suave cantiga de ninar

e memórias dormem entorpecidas

sim,
não há memória nesse casamento
o cigarro é a tônica da relação
as brasas jogam tensões
anseios e pudores
aos céus
e tudo que se esquenta
é esquecimento

esqueça de tudo
o que falei
lembre-se somente
do que esqueci de falar
e saia

talvez vire fumaça
ou talvez

fume

quarta-feira, 16 de junho de 2010

fogo só


noite inteira
embate solitário
no longuíssimo espaço
do quarto
apertado

brincando de pirofagia imaginária
com os lábios incendiários
de seus pensamentos

até que
queimou a lâmpada


dormiu

quem
te
sonho

sábado, 12 de junho de 2010

Bárbara


o que falar se te vejo
tecendo palavras música
tão afinadas elas
esquentando cama como quem
faz durações suaves
momentos ternos
vivência eterna
nunca igual

sem
pre
co
meço

de lá você nós aqui
tudo ao lado sempre
junto todo em frente
n'olhar instante eterno

ficaquintensa
sempre

segunda-feira, 7 de junho de 2010

bela lua

amanheceu
escancarou peito inteiro
frente ao sol
rasga tudo
todo nu

seu cor
po se
pôs
fez
-
se
lua
inteira
nua